sexta-feira, dezembro 08, 2006

EU

Sabes.. às vezes quero-te dizer que a dor é demasiado real para ser apenas alucinação.
Às vezes, quero abraçar-te e implorar-te que não vás... Que fiques aqui e me embales como a uma criança pequena.
O pânico invade-me. Depois começo a sentir uma espiral, uma espiral que me atira contra a parede e me engole toda a vontade de estar perto das pessoas.
São as lágrimas que se cristalizam na garganta e criam um imenso nó. Elas já não descem pelos olhos. Desaprenderam esse movimento ancestral. Agora só querem viver eternamente nas minhas cordas vocais, onde se depositam e se deixam desfalecer.
Sabes... às vezes quero-te dizer que só a tua presença me acalma esta ânsia da tua voz e dos carinhos, dos afagos que habituaste a minha pele.
Outras apenas quero ficar a ouvir o silêncio gritar enquanto de olhos fechados te transmito anos e anos de fantasias quebradas e gelos que inundam o meu corpo.
Ouço músicas, vejo filmes, tento em vão esquecer a tua voz e o calor das tuas mãos e só elas, só elas, chérie, me conseguem acalmar esta intensa mágoa de todos os beijos que nunca dei.
Não consigo falar com eles, sabias? Eles percorrem a mesma casa que eu, mas são meros espectadores silenciosos das minhas constantes mudanças de humor.
Sempre tive riso fácil. Prostituo a minha boca em gargalhadas que nunca me beijam o coração.
Sempre fui o mais forte. Sempre fui o farol em dia de tempestade. Então eles acham que será sempre assim, que sempre nos maus momentos eu irei confortá-los e que também me confortarei a mim mesmo.
E tu? Confortas-me?
Estou tão doente.. sinto-o nos ossos. Sinto-me a definhar, a minha mente está tão debilitada...
Sabes, amor, o cansaço é uma doença que nos deixa fracos. E eu estou tão cansado... Quando acordo penso que acordo para um novo sonho porque tudo se me é baço aos olhos.
Eu sei que isto vai acabar. Eu sei que esta espera que me gasta os joelhos vai terminar e tudo vai ficar bem.
Eu repito-o para os outros. Como se fosse uma ladaínha. Sorrio-lhes. Afago as suas temeridades e sussurro que a vida é um imenso rol de pedras na estrada e que nem por isso a estrada acaba.
E é verdade... quem acaba sou eu. Eu é que me acabo nestes silêncios, nestas constantes implosões, nestes destroços que escondo por trás do ar desleixado e confiante.
E depois inundo-te de dor e dúvidas, e lágrimas que nunca sei chorar e que só escorrem na voz.
Eu sei que amanhã é um novo dia e que eu sempre fui mestre a fingir forças e ternuras.
Eu sei tudo isso.
Fui eu que inventei as mais belas frases de consolo e depois as repeti a mim mesmo enquanto no ar choviam acusações.
Fui eu que acariciei os meus dedos nas noites em que ninguém vinha ver se os cobertores eram brancos e perfumados.
Fui eu que escrevi os mais poéticos contos para me entreter os gritos que se semeavam nos cadernos, nos diários, nas paredes, nas palavras que nunca deixei sair do peito.
Sim amor. Fui eu. Eu que teci muros em volta do meu eu tão moribundo e me resgatei suavemente.
Porque não o sei fazer agora?
Porque agora não estou sozinho. Agora estás aqui. E o meu eu já não responde aos contos, nem aos meus dedos, nem às minhas frases.
Apenas às tuas.
Só a tua presença acalma esta necessidade de me refugiar.
Nunca falei a mesma língua que as outras crianças. Nunca fui inocente e puro. Mas fui sonhador.
Ainda sou.
E depois veio a escrita. O meu pecado e a minha redenção.
Eu queria dizer que ela existe porque tu existes. Ou que ela existe porque é boa. Mas não. Ela existe simplesmente porque eu existo.
É consequente da minha voz apagada como a sombra é consequência do Sol.
Sabes... às vezes quero tão só dizer que te amo... E é essa a única certeza que tenho neste lodo que é a minha alma. Onde chafurdo nos meus próprios dejectos e indecisões.
Outras... nas outras estou demasiado entretido a fingir felicidade para me lembrar o que penso ou quero ou planeio.
Vou aguardar o teu regresso. Sei que voltas e desejo-te nos meus braços. E eu vou alimentar-me da tua presença como um malmequer se alimenta dos raios solares.
Até lá grito silenciosamente. Para não os acordar e assustar... Vou continuar a tolerar as suas presenças tão subtis, tão cómodas, tão cegas.
Vem salvar-me... preciso de ti... A noite é demasiado assustadora. Vem... estou aqui... porque não me ouves? Onde estás? ... Quase te posso sentir, mas não te consigo tocar. Aqui ao lado eles continuam as suas vidas paralelas à minha.
À minha vida que só o é quando estás comigo.

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu sei quem tu és.....és a minha paixão,a minha loucura,a minha sanidade,és o meu sonho e a minha realidade,és simplesmente MEU!!
Bjs Kicas