segunda-feira, fevereiro 26, 2007

SABORES

Gosto do sabor de algumas palavras, as que tocam mais na língua,
as que se soltam devagar para cair em outra boca;
gosto das palavras que avermelham os lábios e embebedam o corpo;
gosto das palavras que segredam suspiros e das que sustêm a respiração; gosto até das que nunca disseste. Não lhes conheço o gosto, mas adivinho-as... macias, doces.
Aluguei-te um quarto de mim e abri-lhe uma janela virada ao sol. Queria que aí vivesses como se fosses um dos meus ossos, talvez a coluna por ser o eixo do corpo, como um mastro de um barco. Quero partilhar contigo todos os cantos e oferecer-te a caixa perfumada dos meus sonhos.
Tenho-te guardada num sorriso adolescente que, abro às vezes, para te inventar. Gosto de te encontrar no tempo que ali se esgota e se rende e fecho os olhos. Iludidos vêem-te perto, e as palavras que cruzamos serão eternas porque não chegaram a nascer, nunca foram ditas. Quase te sinto a pele quando me finjo acolher nos teus braços e me entrego para que me tenhas... e sempre que me despeço de ti, faço-o devagar, com as pontas dos dedos, sem pressa... pois o tempo não se esgota.
Lembro-te que para além das flores, dos sorrisos, das lágrimas, dos poemas e dos sonhos existem os nossos corpos. Não perguntes se estão antes ou depois, digo-te que os prefiro juntos. Às vezes até penso que estão para além de nós próprios. E um dia, serão eles a fazer as honras da loucura. Sem pedir licença, no frenesim que nos destrona da realidade. Serão cavalos selvagens ou caldeiras descontroladas. Descarrilados e torcidos com as forças que dizimam.
Lembro-me de sentir o estômago às voltas quando te beijei e por sentir que a Mulher que Amo é perfeita, que não tem defeito físico nem moral, completa, modelar, exemplar, bela, formosa, impecável, total, cabal, magistral, linda...
Vim ver-te. Pelo meio do fumo das chaminés, da calçada encardida, do Sol que se faz demasiado cedo, dalgumas nuvens cinzas.
Ainda assim, arredo essa cortina de demasiada realidade e vasculho o reflexo do teu cabelo na minha boca e o sopro do vento nas canas. De todas as pinturas, escolho o teu cabelo na minha boca, por causa dos abraços demasiado apertados. Lembro-os com as mesmas saudades que me vão queimando a carne, derretendo a alma por em ti sentir-me completo preenchendo-te o âmago com um sopro de Amor.

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