segunda-feira, dezembro 24, 2007

IV - A PERGUNTA

Por alguns instantes deixei-me levar por cenários imaginários e probabilidades infindáveis, pinceladas de cor nas sombras abstractas da minha imaginação, brilhos deixados num por do sol cheio de luas, penumbra de sentimentos traçados a pormenor, com um pincel fino, que a brisa marinha desbota no invisível, deste mundo de criatividade. O teu olhar critico que deixa o destino da tela, à mercê dos meus olhos fechados, confiante no talento que me nasce da alma, cores que escorrem e se misturam sem sentido, dão vida a uma melodia silenciosa que os olhares escutam ao passarem por estas palavras que foram deixadas, texturas do momento que nunca mais se repetem e que o tacto de quem sonha ao contrário, sentirá de outra forma.

Alguém que me haveria deixado aquelas palavras conhecia o meu trabalho fora do mundo comercial que me sustentava no dia-a-dia. Fora fotógrafo para as Nações Unidas e muito do trabalho feito fora no âmbito de acções humanitárias. Algumas das minhas fotografias haviam sido já publicadas em revistas à uns anos atrás, mas desde a minha recente perda que não haveria mais procurado essas acções. Foi um choque tremendo quando um carro da ONU estacionou junto ao meu apartamento e de lá vi sair o Major Pethersson, um inglês destacado em Portugal e servia de “lieson” com os serviços secretos e a ONU, e um Alferes que mais tarde vim a saber se tratar de um colega de Raquel.

Raquel é uma militar. Estava destacada no Darfur ao serviço da ONU numa missão humanitária quando o veículo que a transportava pisou uma mina. Sempre me havia dito que um dia algo de grave lhe iria acontecer. Conversas de almofada quando as carícias reinam e os olhares delicados demonstram o amor entre ambos. Uma Mulher linda e muito inteligente. Fazia a supervisão e coordenação dos vários destacamento na localidade para onde havia sido destacada. Olhos castanho-esverdeados, lindos cabelos loiros e um rosto angelical de menina-mulher. Agora… um corpo que descansa num hospital ainda em coma profundo e que todos os dias pelas sete horas da tarde eu visitava. Para mim, continua a ser Raquel, a Mulher por quem me apaixonei.

Sacudi o pó que havia levantado do cadeirão. Levantei-me e encerrei a carta de novo no envelope que se fazia portador de tal mensagem. Não podia deixar de me sentir incrédulo, perturbado até com tal mensagem. Minhas fotografias haviam sido expostas à algum tempo numa galeria de um amigo, mas eram algumas apenas e sem grande referência à minha pessoa.

-Será que alguém me reconheceu? E como terá chegado até ao meu estúdio?

(Continua...)

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