segunda-feira, dezembro 31, 2007

VI - SILHUETA

Decidi não pensar mais em ti, quero escapar das malhas deste Amor que me faz sofrer, quero navegar por mares mais calmos, menos tortuosos, quero perder-me à deriva de momentos que sonhei e onde tu não pertences, não quero ouvir a tua voz em mim, oiço o mar de sonhos que me leva nas suas ondas de Paz, para um mundo, um espaço longe daqui, fora deste universo que se virou contra mim. Não vale a pena sonhar mais, apenas quero partir.

E assim o fiz, no vazio que me atormenta, me empurra de encontro ao chão que os sapatos pretos pisam, sinto-me sem forças, não consigo mesmo pensar e apenas me rastejo por entre as ruas da cidade que me levam de beco em beco à procura de uma luz, de uma mão que me traga as respostas às perguntas que já esqueci. As lágrimas lavaram-me o discernimento enquanto o tempo passa e estas paredes que me passam ao lado, de passeio em passeio, as paredes de amor que construímos caíram, tijolo a tijolo, um a um, numa destruição lenta e sofrida a cada visita ao teu olhar cerrado que admirei de perto, mesmo ao teu lado, não sou tão forte quanto pensava.

- Mas que egoísta é este em que te tornaste?!!!! – Exclamei em voz alta afastando as lágrimas do rosto que caíam na laje fria e cinzenta do passeio que contrastava com o reflexo doirado do sol no fim de um dia de Outono, e as folhas caídas, castanhas quentes de uma outrora árvore carregada de vida. Olhei de lado e as pessoas passavam por mim e olhavam-me com uma frieza estranha, um desdém que se sentia na pele. Pensavam que seria apenas mais um dos muitos menos afortunados desta cidade implacável e que por aí deambulavam a falar sozinhos numa busca interminável pelo fim do mundo.

Retornei ao estúdio, claramente uma das vantagens de ser freelancer num mundo cheio de relógios de ponto podendo assim escapar para aventuras no tempo que de outra forma se fariam apenas no imaginário.

Subi as escadas. Sentia-me com vontade de me castigar pelo egoísmo momentâneo mas sabia que enquanto Homem, haveria de existir sempre lugar para momentos desses. Tinha 96 fotografias para revelar de uma reportagem que iria ser feita por um colega e amigo jornalista sobre as ruas desta mesma cidade. Achei interessante o trabalho, a possibilidade de olhar pela lente da minha câmara os mesmos olhares que passam por mim, mas que se tornam diferentes quando pintados de repente, olhares honestos, ruas que se fazem vielas no tempo e onde o espaço se torna cheio de sentires e os cheiros se sentem, quentes, olho as janelas e encontro aventuras, mistérios loucos imaginamos desvendáveis só por dizer.

A meio do prédio e ainda subindo as escadas, vejo a descer pelo ascensor uma figura proeminentemente feminina, embora com a face escondida por entre os vidros foscos pelo tempo, era visível a sua silhueta de mulher e de cabelos compridos. Era raro encontrar uma mulher neste prédio. Chegado a porta do estúdio, procuro a chave por entre os bolsos do casaco que me acompanha sempre a cada jornada do despontar do dia nesta estação. O frio aqui na cidade faz-se sentir cada vez mais a cada dia, fazendo-me por vezes recordar as gélidas noites da savana quando com Raquel nos aventurávamos a escapar da sua unidade militar para admirar a paisagem inigualável de África. Recordo-me do fogo que nos invadia a alma e o corpo quando estendidos por entre a folhagem, não precisávamos de falar, os olhos soltavam palavras, sentimentos que não se faziam ouvir, os olhos falam e amam, as mão subiam e avançavam por entre os corpos que sulcando cada pedacinho de pele, se sentia o arrepio do coiote que ao longe uivava à sua musa que todas as noites subia ao estendal do horizonte e o inspirava na sua balada.

Abri a porta e encontrei de novo um envelope no chão. Peguei nele, de novo sem remetente ou destinatário. Virei costas e mesmo deixando a porta aberta zarpei como um louco pelas escadas, galgando degraus como se fosse uma chita em pleno acto de caça, predador que busca a sua presa que certamente descia pelo ascensor. Ofegante e a transpirar cheguei finalmente ao término daquela longa viagem, o ascensor vazio oferecia-me uma caçada infrutífera. A silhueta misteriosa que certamente me teria deixado aquele envelope era já uma das muitas que se misturava na multidão das ruas lá fora.

Cabisbaixo iniciei nova jornada escadas acima, nem sequer coloquei a hipótese de ir de boleia no ascensor. Algo me fazia crer que necessitava de tempo até ao recôndito do meu estúdio. Sem qualquer traço que me deixasse alguma indicação no envelope e sem mais tempo ou cuidado rasguei as suas margens. Desta vez, uma folha de uma árvore, velha, vincada no seu espaço e no seu tempo, sentia na sua textura as rugas do Outono e o cheiro a lareiras nocturnas. Não percebia o seu significado, por isso deixei-a de lado para deliciar a minha curiosidade nas letras e palavras que ali se ofereciam naquele pedaço de papel.

Esperei-te à porta e não me beijaste, amuei. Falei contigo e tu não me respondeste, desgostei. Sorri-te e tu não me sorriste, chorei. Olhei-te e tu não me olhaste, desesperei.
Disse que te amo e tu não me ouviste
, desanimei. Toquei-te e tu não me sentiste, sofri. Insinuei-me e tu não me deste atenção, agonizei.

Desperta-me, não me deixes dormir, despe-me a pele, abraça-te à minha alma, acorda-me com as tuas mãos, estimula-me os sentidos com a tua boca, olha-me nos olhos e leva-me para dentro de ti, aviva-me o fogo, atiça-me o desejo, acende-me o Amor imenso que tenho dentro, a minha pele arde por um toque teu, os meus seios esperam-te, o meu corpo quer-te, as minhas mãos procuram-te, chega-te a mim, quero fazer amor contigo mais uma vez, a última vez.

Eu repousava num mundo diferente, sonhava sonhos que não sabia, esperava-te sempre andando, porque não sabia que estavas aqui, tão perto.

Chegaste trazido pelas tuas asas de Luz e pousaste em mim, trespassaste-me com a intensidade dos sentimentos sonhados, guardaste-me para sempre no nosso Amor, olhaste-me e beijaste-me, prendi-te para sempre no meu coração, na minha alma, no meu ser.

Fazes parte de mim por esta eternidade que me leva para parte incerta...
Procuro-te...
Onde estás?”

(Continua...)

quinta-feira, dezembro 27, 2007

V - REENCONTRO

Não me demorei a procurar pelo telefone por entre as fotografias e negativos que se espalhavam pela secretária e liguei para o João, um velho amigo de infância que administrava a galeria onde expunha alguns dos meus trabalhos. Questionei-lhe sobre se ainda mantinha as minhas fotografias expostas e se alguém recentemente havia desenvolvido algum interesse em particular pelas mesmas “-Amigo, que bom ouvir-te. Sim realmente à uns dias uma pessoa demonstrou um interesse muito grande por elas, inclusivé estaria interessada em as adquirir.

-Não acredito! “retroqui de imediado com um ar sobejamente pasmado”

-Sim acredita. Uma moça, muito bonita adianto-te já, e perguntou-me se poderia te contactar para combinar o preço, por isso, dei o teu contacto aí do teu escritório. Fiz bem certo?

-Sim, sim João, agradeço-te a amabilidade. “desliguei a chamada incrédulo ainda.”

Decidi não mais dar tempo ao que não teria tempo, ou pensava eu não ter ou não querer. Na subtileza desse sentir, deixo o pensamento voar no instante do acaso e fecho os olhos. Lembro-me de ti, das tardes infindáveis de prazer, nas sensações que me animam quando nossas almas se encontravam para lá de nós e tocavam os limites infinitos da eternidade… “sorri”… recebo na minha face agora entristecida uma gota de saudade, nascida da luz ténue que se atravessa as janelas com portadas de madeira fechadas, lágrima solitária que perde forças no meu sorriso de criança, beija-me os lábios da mesma forma que tu me farias e cai desamparada no abismo da melancolia. Levanto-me do cadeirão, afasto a nostalgia que me enlaçou sem aviso e retribuo-lhe com o conforto das recordações, roço o céu com a minha essência e trago o brilho das estrelas colado nos fios do meu cabelo, e decido abrir o coração ao amor.

Saio pela porta fora sem pensar duas vezes. De olhos fechados dou início ao ritual, encanto sensações à flor da pele, enfeitiço a doçura das palavras, liberto desejos contidos e aconchego o casaco ao pescoço, e ouvem-se os meus passos acelarados para te ter mais perto.

Num passe de magia, o tempo e o espaço diluem-se por entre os protocolos de um relógio de cordas e acontece, num fugaz momento de felicidade estou junto da minha amada.

-Hoje sorri, quando ao de leve beijei os teus lábios! “disse-lhe eu por entre um sussurro ao ouvido na esperança subtil que seus olhos se abrissem”. Subtil promessa de amor esta que nos une, paixão que prova, saboreia, confessa e envolve a sumptuosidade e a grandeza das fantasias que se soltam entre os teus cabelos, ali caídos, decobrindo secretos anseios e revelando confessos caprichos que me tocam a pele, num fluir de gritos surdos que ecoam nas paredes do meu querer que se quer fazer teu.

“Suspirei”

Serena meditação esta, ali, sentado ao teu lado, de mão dada na intensidade dos sentidos, que param, esperam, estremecem e abraçam só para si, o auge do desejo prometido que me ofereceste nas tuas mãos, e agora, suspenso num tempo que não existe, não se faz sentir passar.

Mas o tempo realmente passa e ali era o momento de fechar os olhos e partir de novo pelo mundo lá fora. Um ultimo beijo, no canto dos lábios, o teu sabor, a injunção de um sofrer que transborda dos lábios de quem te procura na superfície de um qualquer lago, e não te vê, porque te sabe infinita na eternidade e a doçura escorre por entre os dedos.

-Até amanhã meu amor… estarei contigo de novo, hoje à noite em teus sonhos.

Parti de livre-arbitreo ou por uma imposição de forças que não se vêem, sentem-se, para lá da pele. Antagonismos e venturas de uma vida, perdida por ora na procura de uma felicidade momentânea, um instante, um ensejo em de novo ver teus olhos se abrirem, cálices do brilho da minha alma, mas o dia continuava…

(Continua…)

segunda-feira, dezembro 24, 2007

IV - A PERGUNTA

Por alguns instantes deixei-me levar por cenários imaginários e probabilidades infindáveis, pinceladas de cor nas sombras abstractas da minha imaginação, brilhos deixados num por do sol cheio de luas, penumbra de sentimentos traçados a pormenor, com um pincel fino, que a brisa marinha desbota no invisível, deste mundo de criatividade. O teu olhar critico que deixa o destino da tela, à mercê dos meus olhos fechados, confiante no talento que me nasce da alma, cores que escorrem e se misturam sem sentido, dão vida a uma melodia silenciosa que os olhares escutam ao passarem por estas palavras que foram deixadas, texturas do momento que nunca mais se repetem e que o tacto de quem sonha ao contrário, sentirá de outra forma.

Alguém que me haveria deixado aquelas palavras conhecia o meu trabalho fora do mundo comercial que me sustentava no dia-a-dia. Fora fotógrafo para as Nações Unidas e muito do trabalho feito fora no âmbito de acções humanitárias. Algumas das minhas fotografias haviam sido já publicadas em revistas à uns anos atrás, mas desde a minha recente perda que não haveria mais procurado essas acções. Foi um choque tremendo quando um carro da ONU estacionou junto ao meu apartamento e de lá vi sair o Major Pethersson, um inglês destacado em Portugal e servia de “lieson” com os serviços secretos e a ONU, e um Alferes que mais tarde vim a saber se tratar de um colega de Raquel.

Raquel é uma militar. Estava destacada no Darfur ao serviço da ONU numa missão humanitária quando o veículo que a transportava pisou uma mina. Sempre me havia dito que um dia algo de grave lhe iria acontecer. Conversas de almofada quando as carícias reinam e os olhares delicados demonstram o amor entre ambos. Uma Mulher linda e muito inteligente. Fazia a supervisão e coordenação dos vários destacamento na localidade para onde havia sido destacada. Olhos castanho-esverdeados, lindos cabelos loiros e um rosto angelical de menina-mulher. Agora… um corpo que descansa num hospital ainda em coma profundo e que todos os dias pelas sete horas da tarde eu visitava. Para mim, continua a ser Raquel, a Mulher por quem me apaixonei.

Sacudi o pó que havia levantado do cadeirão. Levantei-me e encerrei a carta de novo no envelope que se fazia portador de tal mensagem. Não podia deixar de me sentir incrédulo, perturbado até com tal mensagem. Minhas fotografias haviam sido expostas à algum tempo numa galeria de um amigo, mas eram algumas apenas e sem grande referência à minha pessoa.

-Será que alguém me reconheceu? E como terá chegado até ao meu estúdio?

(Continua...)

sexta-feira, dezembro 21, 2007

III - DESPERTAR

Na caminhada, as folhas caídas que piso pela calçada são como estrelas da saudade dos passeios a dois. Continuo a percorrer as avenidas, golas do casaco subidas porque o tempo mostra o seu vigor e o frio, apesar do sol, vinca-se-me na pele como as tuas unhas se faziam por entre carícias ousadas.

Mantenho-me fiel ao percurso. Invento o som dos meus passos e sigo os teus como se uma brincadeira de crianças se tratasse. Dobro a esquinha e vislumbro a fachada da tua essência. A fonte onde outrora afogamos a sede por entre sussurros de loucas fantasias que o devaneio nos punha na boca. Magia deliciosamente ardente. Está frio, sim o vento congela-me o pensamento que tarde em te levar de mim, provavelmente não o desejo, mas… continuo a andar, passo acelerado por entre a multidão. Nestes dias de outono gosto de me misturar com as pessoas, provar-lhes o sentimento do seu rosto, sentir os cheiros da cidade que sempre se mudam para algo de novo, e as manhãs se transformam no alvorecer de uma vida nova.

“-Bom dia!” – todos os dias a mesma cara, o mesmo segurança. O prédio, o número 19 da Avenida dos Combatentes era já antigo mas nem por isso perdia o seu encanto. A fachada simples de pedra escurecida pelo tempo contrastava com o envidraçado moderno que ali havia sido colocado aquando a sua restauração. Servia os meus intentos perfeitamente. Subi ao último andar onde entrei no meu improvisado estúdio. Era ali que muita da magia se fazia, onde a febre da ansiedade do que havia capturado no tempo com a minha câmara, se apresentava ao mundo delimitado por horizontes oblíquos mas sem nunca perder a sua essência.

O correio havia sido deixado por debaixo da porta. Um trabalho a ser feito dali a 5 dias para um jornal local, as contas do costume e um envelope sem remetente e destinatário. “-Estranho!” não pude conter a exclamação em voz alta. Arrumei todas as restantes cartas atirando-as para o chão e delicadamente fui vincando o envelope, abrindo-o sem o danificar. Perfume, sim aquele papel estava perfumado. No topo da folha uma frase… “O que os teus olhos captam, minha péle sente…”. Estava escrito de uma forma solta, leve, alguém sem compromisso na sua escrita. Fiquei ainda mais curioso e começei a ler o texto:

Oiço o movimento do roçar alucinado, a pele que se toca e se excita, que desliza entre o suor de mel que nos transpira da alma, sinto o cheiro da paixão nos nossos beijos escorregados, as línguas enroladas, as bocas sugadas e mordiscadas.
Saboreio o teu doce suspirar, a ternura dos murmurios que me dizes ao ouvido, quando o prazer te chama a mim, e o ímpeto te empurra ao sabor dos impulsos que o corpo te pede. Procuras dar-me mais, e mais receber de mim, afogas-te nos meus cabelos, tocas-me os lábios, envolves-me os seios, afagas-me a face, memorizas e absorves a chama do meu Amor.
As tuas mãos emanam loucuras dementes, inventadas e reinventadas, moldam-se e ajustam-se subtilmente, quando se entranham em mim indo de encontro ao meu toque húmido e quente, que espera por ti...”

Caí literalmente no cadeirão que estratégicamente se fazia ali bem perto de mim. Não pude deixar de esboçar um sorriso iluminado que contrastava com a aparência rude e embrutecida daquele estúdio.

“-Quem me escreve?” perguntava-me insistentemente olhando para a caligrafia, buscando algum traço, alguma sílaba que me trouxesse a autora de tais palavras… Não te vejo, não te conheço, mas sinto que me espreitas, entre a folhagem do meu paraíso rodeias-me com a ternura do teu olhar que apenas assim poderá conhecer o calor das minhas mãos. Não sei onde estás, nem quem tu serás… mas como me conheces tu?

(Continua...)

quinta-feira, dezembro 20, 2007

II - AMANHECER

- Não posso continuar assim!

Foram estas as primeiras palavras soltas por entre a húmida manhã que se fazia sentir. Sentei-me na cama, pés descalços poisados no parquê de madeira ainda à dias composto de uma inundação no quarto vinda do andar de cima. Se ao menos ainda tivesse estado em casa nesse dia, mas minha presença era necessária noutro local. Não era dificíl adivinhar qual a ocupação que me levaria a estar ausente mais de metade da minha vida. Basta olhar nas maquetes e fotografias espalhadas pela casa, umas a cores, fantasiadas na realidade pelas cores do tempo e outras a preto mascarado com o branco, são estas últimas que nos trazem os sentimentos profundos e nos levitam a alma para um mundo perdido.

Levantei-me… eram sete horas e um quarto e dali a pouco a padaria abriria. É lá que me sirvo do pequeno-almoço. Pão quente com manteiga derretida e um café preto sem açucar. Saudável ou não porque importa por agora. Tempo houve que o servia na cama. O olhar cabisbaixo anuncia a tristeza e quando a saudade espreita em lugares inesperados, eu escondo-me dela, procuro refúgio longe dos resquícios de ti, que ainda guardo em mim e que o tempo ainda não levou. Hoje a realidade separa-nos e eu continuo ainda a confundir a realidade com a ilusão. Como será possível alguém ter deixado tais marcas que ainda hoje, só, sinto o perfume das palavras e o encanto daquela voz.

Um estalo… tinha de acordar. De nada adiantaria estar ali, parado a olhar pela janela o dia que agora nasce, e do céu desponta o sol que me aquece o peito desnudado. Mas também não era necessário bater em mim com tal vigor… esta doeu.

Já arranjado, jeans vestidos, camisa preta às riscas brancas, casaco de couro preto e camara e estojo ao ombro, oculos de sol, desci pelas escadas e entrei na padaria. Abri a porta e deparei com o tufão quente que se fabrica ali, um ambiente acolhedor, rústico mas decente “-Bom dia! O normal sim?” uma das claras vantagens para quem gosta de manter o seu acordar tipicamente metropolitano. Basta aparecer uns dias seguidos no mesmo local que o normal pedido de pequeno-almoço se transforma na frase “o normal”.

A sós comigo, tapo-me com a ausência, dou descanso ao corpo inquieto e sedente pelo teu e tento apagar da pele a lembrança dos teus beijos molhados de paixão. Relaxo os músculos e bebo um pouco do meu café amargo mas mascarado com o sabor do leite. O meu olhar cansado não disfarçava. Tinha sido uma noite longa e cansativa. Desperto das memórias esquecidas envolvo-me pelos aromas e sabores que aquela manteiga derretida se faz pelo meu paladar.

Levanto-me, troco certo na mesa, nas mãos trago pedacinhos da tua essência por entre o almiscarado da manteiga que se derramou pelos dedos. Volto a sair e enfrento a realidade nua que ali se avizinha pelas ruas. Estava na hora de voltar ao trabalho.

(Continua...)

quarta-feira, dezembro 19, 2007

I - O INÍCIO

Apagam-se as luzes, no silêncio premeditado, esvoaçam anónimas vibrações de aplausos inúteis e inglórios. Sobre mim, cai o pano da verdade, a alma fica a descoberto revelando a pura nudez da minha essência, lentamente as emoções e os sentimentos verdadeiros, são resgatados da noite que me aconchega.

Recolho-me no exíguo camarim do meu âmago, caracterizo-me de mim, revejo-me no espelho do tempo, e deixo-me ser aquilo que sou.

Desenlaço das mãos, a inocência, que escondo, quando me defendo das falsas luzes da ribalta, acendo a ternura do meu olhar, e experimento a liberdade de rir, chorar e gritar sem guião.

Protegido, na cumplicidade da escuridão, solto o pesado ónus da minha existência, desato as amarras que me confinam estes movimentos corporais, inverto a história, e solto-me da realidade artificial que me inventaram.


Descubro então, a espontaneidade do meu sorriso, quando saio airosamente pela porta principal dos meus sonhos e vou ao teu encontro...


No pulsar desse encontro dos teus olhos nos meus, o tempo parou, o espaço apagou-se, o horizonte desceu sobre nós e trancou as portas ao mundo dos outros.

Naquele instante que se fez eterno, a leveza do brilho cúmplice das almas, uniu-se para lá dos sentidos, viajou para o nosso mundo de magias, na cauda de um cometa e fugiu dali.
Nos corpos expectantes, os sentidos afloram, o carinho surge na pureza de um respirar mais profundo, a ternura entrega-se ao abandono do sonho e voam carícias suaves, das mãos sedentas que não se tocam.

Apenas com um olhar, as essências mesclam-se, os olhos invadem-se, encerram-se um no outro, prendem-se ao desejo, e muito para além das paredes da realidade que nos rodeia, o nosso Amor acontece, entre o teu pestanejar e o meu.

Era manhã... o dia despontava por entre os panos alaranjarados que se faziam de cortinas... fugindo agora da penumbra as pestanas abriam-se, uma e outra vez, como se estivessem a descobrir um novo mundo agora no horizonte... Teria sido um sonho? O despertar esquizofrénico do rádio relembrou-me que a realidade era aquela e a noite teria sido apenas um paraíso num instante...

(Continua...)

POEMA DE AMOR

Não me importa o dia
Nem a hora
Não importa o vento
Nem a chuva lá fora
Não me importa
Que haja neve ou geada
Que seja noite ou madrugada

Não me importa
Que faça frio ou calor
Que o céu esteja cinzento
Ameaçador...


Se sob esse céu de tempestade
Pairar o perfume
Do teu amor!...


Não quero saber
Se é Verão ou Inverno
Se é Outono ou Primavera
Não quero saber
Nem o século nem a era
Nem o mês nem o ano
Quero tão-somente dizer
Que te amo...

domingo, dezembro 16, 2007

ESPELHO TEU

Beleza nua, paisagem tua, que meus olhos devoram. Pureza tua, alma nua, que os meus sentidos adoram. Escondida sob a penumbra da seda, danças em minha frente, ondolante como a brisa do vento encontrando-te com o olhar de quem desenha traços suaves sobre o teu corpo de cetim.

Imagino, os sentimentos que se escondem por detrás dessa cortina que te cobre, mas, simultâneamente te despe, num gesto de magia que envolve este momento, em que sentado te observo, e te vejo balançar ao ritmo da música suave da lagoa que se ilumina em teu espelho.

Imagem perdida no negro desta noite, que só a ti ilumina, suavidade no contorno dos teus braços que o carvão imprime sobre a tela, numa paisagem enebriante que me turva a mente.

Apenas tu, podes fazer brilhar o poder da criação, que num instante me faz Homem.

ESTA CIDADE

Na luz amarelada deste Outono quente a cidade oferece-se languidamente.

Recostada no Douro como numa chaise-long, deixa escorrer o sol nos becos e nas ruas da cidade velha. Envolve-se com a vizinhança num displicente fluir de pontes.

Abre a foz ao mar que lhe traz ondas ainda pouco agitadas. Deixa erguer nas praias ásperos rochedos do mesmo modo que assume a tropicalidade das palmeiras e jacarandás. Exprime-se em sons e cheiros tão indefinidos quanto inesperados.

Porto de revoluções, de lutas e de ofertas generosas. Que se esconde nos nevoeiros matinais, para se revelar, com esplendor, ao meio-dia e onde a noite mantém um inalterável jogo de luzes cansadas.

Porto de Outono que desafia para os passeios, os encontros, as descobertas.

E porque não para o amor?

Experimentemos as ruas estreitas, os enormes portais antigos, as varandas de sardinheiras. Os pátios e as praças. O Largo da Bandeirinha, a Fonte da Colher, a Rua do Gólgota, o convento de Monchique, de cuja janela Teresa viu partir Simão Botelho. O Miradouro (mira-Douro) de Santa Catarina no fim da tarde…

Surpreende-te com esta toponímia e com as excentricidades de uma cidade que, apesar de uma aparência fechada, se sabe revelar a quem a souber descobrir

sexta-feira, dezembro 14, 2007

PRENÚNCIOS


Estes são dias frios, onde o Outono se mistura com o prazer do Inverno e se fazem senhores de uma batalha contra o tempo.
Estes são dias com cheiro a maresia, onde as gaivotas anunciam um sol que brilha no espelho das ondas que batem junto à praia.
Estes são dias onde os passeios de mão dada se fazem de cachecol e os beijos se selam intensamente na procura do quente que transborda da alma.
Estes são dias que as manhãs se querem longas, onde os lençóis nos prendem à cama e o café da manhã é servido de bandeja.
Estes são dias que querem frios para que o amor os faça quentes e a paixão transborda por entre o sorriso partilhado a dois.
Estes são dias que a noite se faz ao luar, intensa, ardente, onde o toque da tua pele é seda em meus dedos, e os odores se misturam numa mescla de sentimentos.
Estas são noites passadas a dois, onde as velas se acendem e iluminam a sombra dos corpos que se fundem num prazer uníssono e os olhos vibram ao ritmo do coração.
Estas são madrugadas longas de paixão imensa, selada pelo suor que partilhado a dois, se mistura no jardim do éden e a maçã se come a dois.
Este é o meu Outono, um prenúncio de um Inverno, quente e majestoso, onde te levo o aconchego e o descanso do teu sono.

quinta-feira, dezembro 13, 2007

PROCURO-TE

Por terras lusitanas
Entre campos de trigo
semeados por camponeses
e extensos roseirais,
de aromas incandescentes.

Cavalgando ao sabor do vento,
na pele de Pedro Álvares Cabral
percorro belas planícies.
Terra de bravos campinos,
e imponentes touros.


Navego neste imenso mar
na pele de Vasco Da Gama
na incessante esperança
de te encontrar.
Vislumbro audazes pescadores
que enfrentam o imponente
e revolto mar..

Voo alto como uma águia
na pele de Gago Coutinho.
Avisto belas e verdejantes
montanhas,
tenazes pastores
e seus rebanhos,
em profundos e sombrios
Vales.
Beija-me.
Beija...
Só para sentir o teu sabor uma e outra vez.

Já não me chega morder o lábio para te sentir.
Já não me basta ter o teu sabor.
Quero que me beijes.
Agora. Sempre.

quarta-feira, dezembro 12, 2007

DEIXA-ME FAZER-TE MINHA

Senti o sangue pulsar a toda a velocidade. Decidi deixar-me envolver ao abandono na tua aventura imprevista e nos caprichos do teu desejo.

De acordo, aceito todas as regras que me queiras impor no teu jogo de prazer, vou-te deixar dar as cartas... mas acredita, de repente o jogo pode virar, e talvez, quem sabe, acabe por ser eu a ludibriar-te.
“Cara mía”
As palavras saíram num sussurro quase inaudível, deixaste-me tenso de desejo, e antes que pudesse resistir, senti os meus lábios unirem-se aos teus. O calor da tua boca, a essência que emanava do teu corpo, o teu olhar animal, selvagem fizeram com que todos os meus nervos vibrassem de prazer. Língua e lábios acenderam chamas sobre a minha pele, ate um ponto de excitação tão alto que não me restava mais nada do que me desfazer em cinzas...
Deixas-te claro... A paixão entre nos não tinha regras.

Despir-te, tocar-te, fazer-te minha. Era tudo o que eu queria naquele momento. Saborear-te, fazer-te gritar de prazer. Transmitir-te todo o meu desejo através dos meus lábios, das minhas mãos e do calor do meu corpo. Possuir-te de todas as maneiras possíveis que um homem pode possuir uma mulher.

Apertei-te contra mim, fazendo com que sentisses a minha erecção. A promessa da noite que nos esperava.... Os teus beijos toldavam-me os sentidos e a excitação bombeava-me a adrenalina. Apesar de me sentir enlouquecido, apesar do desespero em que o meu corpo se encontrava, controlei-me ao máximo e concentrei-me em ti, nas tuas formas, tocando-te e lambendo-te, deixando-te sentir a loucura que corria e pulsava dentro de mim.... Esta noite é tua cara mia e quero que seja perfeita, que sintas o quanto te quero e te desejo...deixar-te louca... fazer-te esquecer tudo o que alguma vez conheceste...

terça-feira, dezembro 11, 2007

ESTA NOITE

Esta noite não quero milagres realizados, nem prémios recebidos, nem verdades reveladas.

Esta noite não desejo visual aplaudido, nem dores aliviadas, nem ânimos acalmados.

Esta noite não preciso de janelas escancaradas, nem de sentidos aguçados, ou elogios desmedidos.

Neste momento poderia rejeitar uma viagem à Tailândia, uma antologia de Vinicius e ignoraria até mesmo a comida da minha mãe...

Não faço a mínima questão de nada, e meu único pedido és tu: olhar-te, sentir-te, tocar-te.

Morar por minutos eternos dentro do teu sorriso ímpar, e me perder cantando na poesia de teus olhos.

Só precisaria esquecer o meu sono para passar a madrugada contemplando o teu, e entreter-te algum tempo com aqueles meus segredos antigos.

Olhar as gotinhas de chuva caindo solenes pela vidraça e te proteger da dor, do frio e do mundo dentro do meu abraço.

Transformar-te em menina-tímida ou mulher-instinto sem hora marcada e virar êxtase numa dança frenética de línguas, corpos e corações.

Encontrar a paz no mais inocente toque da tua pele e desenhar teu rosto lindo em cada parte do meu corpo, exalando luz por todos os poros.

Acariciar teus cabelos e te acordar com mais sonhos, viajando contigo de mãos dadas para qualquer lugar onde haja vento, flores e lua.

Aprender cada mistério escondido no universo, decorando a vida em seus sentidos soberanos junto ao som dos teus passos que me guiam e completam.

Porque tu és o meu poema perfeito, minha canção favorita, minha escultura bonita. Porque tu és o meu chão, meu yin, meu sol, e porque...

Esta noite - e em todas as outras - tu és o meu único desejo.

domingo, dezembro 09, 2007

O MEU DELÍRIO

Quero vencer todas as barreiras...
Ventos que sopram que te desnudem
Lancem-me no profundo abismo
Que é o meu desejo infinito.
Sou fome de boca aberta
A mastigar os silêncios da noite
Despertando, aos gritos,
O meu corpo adormecido.
Tenho a alma em grande sede
Que mergulha no lago fundo
Do suor que me brota da pele
Em busca do divino prazer.
Ardo em fogo.
Fecho os olhos...
As mãos são labaredas que dedilham
Harpas em catedrais de deuses,
Onde, nus, vagam os meus sonhos,
De uns braços atando-me como corda
A um corpo rijo como rocha,
E sua voz forte como a da águia,
Grito ao universo, a sua vitória,
Ao dominar sob a luminária
Que pende do teto da alcova,
Este leão que uiva na cova
Em explosões de muito amor...
Anseio por te ter,
Por de novo te encontrar.

sexta-feira, dezembro 07, 2007

RIMA DE AMOR

Abraçamo-nos carinhosamente,
entregando-nos a este amor quase demente...
Somente teus doces cheiros sentia...
Na união de nossos corpos eléctricos,
descontrolados, sensualmente frenéticos,
mergulhados em completa demência,.
vou tacteando teus seios...
Nossas coxas entrelaçadas,
na vontade de nossos corpos alucinados,
sentindo o gozo aproximado,
dominados por essa louca emoção...
Sem saber do que em volta se passa,
nosso prazer todos os limites ultrapassa...
Teu corpo nu para mim é um colírio...
Tocá-lo é um constante delírio...
Só quero te amar mais ainda...
Fundir nossos corpos, talvez,
Depois, transbordantes dessa doce sensação,
beijo teu corpo todo com total devoção...
Beijo teu sexo com carinho apaixonado...
Enquanto meus lábios sorvem teu néctar fluido,
tudo em nosso redor adquire outro colorido...
Enquanto gememos de intenso prazer e deleite,
queres que do calor de teu sexo me aproveite...
Entregamo-nos ao nosso amor impaciente,
a esse desejo quase demente...
Com paixão, nossas energias se renovam,
e nossos sexos mais e mais se provam,
nesta nossa paixão alucinada,
que mais vezes se renova...

quinta-feira, dezembro 06, 2007

PORMENORES

Partícula fina, pérola nacre
Adorno menor, pequeno retalho
.
Feminilidade, translúcida opala
Grão de pudor, ínfimo detalhe
.
Bago de amor, fruto de desejo
Recorte de seda, ninho de beijo
.
Semente de corpo, gota de orvalho
Boca do prazer, à flor da pele
.
Tessitura de mel...
nosso secreto atalho.
.
Berço de luz
Feiticeira minguante ou cheia
.
Máscara de prata que seduz,
Se esconde em meia
.
Misteriosa esfera,
Brilho de terra, molhada
.
Sacio-me desse teu nectar de vida,
Numa única jornada a dois.

terça-feira, dezembro 04, 2007

MÃOS A DOIS

Nas mãos que descansam, hiberna um toque que está suspenso, no tempo na vontade... Nas mãos que convidam, amanhecem sons de sombras e luzes de sois e de luas.
Nas mãos que tocam, cristalizam-se tremuras serenam-se os suspiros moldam-se os desejos.
Nas mãos que se querem, que vagueiam e se encontram, se descobrem e reconhecem, a entrega... é sem receio!

segunda-feira, dezembro 03, 2007

QUERO...

um passeio para relaxar os sentidos
um desejo de nos envolve
um prazer que nos percorre
corpos molhados
pernas que se enlaçam
que se envolvem e entranham
sente a vontade do desejo que decorre
devoras-me a cada gemido
possuis-me
e eu gosto...
mordisco os teus seios
e eu gosto...
os meus dedos percorrem trilhos húmidos
e eu gosto...
a tua língua saboreia o melhor de mim
e eu gosto...
o meu tesão penetra-te
e eu...hummmm
e eu gosto....
eu gosto....
gosto...
e num embalar de sensações
embarca-mos na loucura
sim...como eu gosto!
E agora??!!Quero mais!

PENSO

Em que pensar, agora, senão em ti? Tu, que me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a manhã da minha noite. É verdade que te podia Dizer “ Como é mais fácil deixar que as coisas não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos apenas dentro de nós próprios?” Mas ensinaste-me a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou, até sermos um apenas no amor que nos une, contra a solidão que nos divide. Mas é isto o amor, ver-te mesmo quando te não vejo, ouvir a tua voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo
ele que mal corria quando por ele passámos, subindo a margem em que descobri o sentido de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor, de chegar antes de ti para te ver chegar: com a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de água fresca que eu bebo, com esta sede que não passa. Tu: a primavera luminosa da minha expectativa, a mais certa certeza de que gosto de ti, como gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste.

By: Nuno Júdice