Abro os olhos e adormeço os meus desejos... quero ir alienada, coerente na razão aguentando a tempestade que me atravessa o coração, à procura do que é certo. A estrada está cortada. Dois veículos da EUFOR barram a passagem. Pedem-me para regressar, a cidade está sitiada. Tento-lhes explicar a importância da minha viagem, algures naquela estrada faz-se à deriva quem eu procuro. Insisto que devo passar mas as ordens são específicas e ninguém deve passar “- Nunca deixamos alguém para trás, nunca abandonamos um soldado, nunca viramos as costas a quem de nós precisa e não vai ser hoje que irei fazer isso sejam as vossas ordens quais forem.” Gritei com as fagulhas da alma pendurada no céu e um brilho nos olhos que me denuncia o desespero. Nas vozes soltas que o silêncio guarda, olham-me como personagens que somos num palco cujo enredo se faz com forças desconhecidas “- Não deixaremos nunca ninguém, deixe o carro e entre no jipe. Iremos em busca de quem procura!”
Aquelas palavras com poderes de magia aquecem-me o ânimo e sossegam-me o desespero. Entro no jipe e comigo acompanham-me 3 soldados da EUFOR, todos armados. Arrancamos repentinamente como a poeira que se levanta por entre os trilhos que galgamos. “-A cidade está fechada. Hoje não é um bom dia para se andar por aí sozinho. Existem muitas brigadas da guerrilha e esses atacam qualquer um apenas para poderem usar como moeda de troca.” – dizia-me o soldado enquanto percorríamos a estrada.
Num momento indefinido, ali ao longe mas ainda assim tão perto, fora da estrada, um dos veículos do aquartelamento. Conseguia identificar-lo pelo emblema e o código de identificação pintado na carroçaria. Não queria acreditar o que os meus olhos viam, uma silhoeta desfocada no local o condutor, inerte. Fecho os olhos e invade-me uma sensação amarga na boca. Sob a alucinação de cinco luas de brilho, os meus olhos perdem-se na imensidão do céu. O jipe para, saiem os soldados em reconhecimento de quem eu sei que não quero que seja. O tempo pára. Tão subtil e frágil é o sonho que nos toca ao de leve pois ao acordar lento da manha seguinte, pode ele já não se fazer presente. O sorriso... o teu sorriso que me falou nos silêncios que me encantavam com as palavras que ousavas me escrever com os teus olhos. Como é bom saborear a cegueira que me entregas nas entranhas, vincada nos lençóis onde nos deitamos, abraçados ao calor ardente da nossa paixão. Não, não queria acreditar ter-te perdido, ali, sozinho. Ainda guardo o teu beijo comigo, ainda o sinto no céu da minha boca e por isso não podes ser tu aquele que ali se faz sem alma, não podes.
Retorna ao jipe um dos soldados em passo acelerado. Entra e enquanto alcança o rádio profere as palavras que não queria ouvir “-Está morto!”
O mundo fraqueja e num instante o principio faz-se de fim. Solto lágrimas que me ardem na pele e o meu corpo estremece ao lume que se ateou dentro de mim, a alma rende-se ao desespero, saio do jipe e corro a procura do que é certo.
Não.
Não preciso de te recordar, sinto-te comigo, habitas dentro de cada recanto de mim e não posso por isso te perder.
Corro... corro a procura do que é certo.
(Continua...)
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