quarta-feira, janeiro 09, 2008

IX - A DESPEDIDA

São essas pinceladas de cor nas sombras abstractas da minha imaginação, brilhos deixados num por de sol de luas onde na penumbra dos sentimentos se traçam cada pormenor teu. O telefone toca. Com um olhar crítico olho para o número que se misturam em sentimentos à mercê dos meus olhos que os fecho por breves instantes. Sei que se trata do Serviço de informação da ONU. "Boa noite!" atendo eu com uma voz cávada, rouca entre contornos e efeitos visuais de profundo desagrado. Convidam-me a integrar uma nova missão humanitária onde servirei de repórter fotográfico. Num momento de cega loucura, que o tempo jamais irá apagar aceito. Tenho consciência que estarei algum tempo fora e o sentimento de culpa apodera-se de mim. A chamada terminara. Não haviam me cedido muitos pormenores mas ainda assim são segredos abertos estes que apenas eu consigo entender.

Num instante de raiva inesperada, as minhas mãos se atiram ao abismo do meu rosto destruindo o telefone nas tinta que se metamorfosam na parede do quarto. Porque haveria eu concordado com aquele pedido e abandonara Raquel? Esta incompreensão inócua, na simples escolha entre o preto e o branco abre as portas de uma realidade que à muito escondo e temo encontrar.

Na manhã seguinte um pouco mais fresco, preparo o saco de viagem, baú do meu conhecimento em busca do desconhecido dia que me espera longe de casa, afastado da alma que me acalenta o espírito e me atormenta o coração. Uma lámina trespassa-me o corpo, sinto o sabor ferroso da sua dureza mas conheço-me melhor quando envolto em faces desconhecidas. Recolho a câmara no seu estojo com o cuidado de um guerreiro samurai na partida para o seu destino. Aquela era a minha hora.

"Amanhã, não estarei aqui à hora marcada!", sussurro eu agora sentado na cama junto de Raquel. A cor dos lábios não era mais a mesma que me trouxera mundos de fantasia e sabores adocicados. "Estarei longe deste mundo de sonhos e iusões que criei para mim. Vou partir, mas sei que não vou sozinho pois levo-te comigo, levo as minhas mãos entrelançadas na saudade do teu toque e sei que na minha boca ainda consigo saborear pedaços de ti meu amor, pedaços que me ofereceste em beijos e ousadias por onde ecoa a tua voz que me acompanha na bagagem da minha pele e onde sempre te encontrarei."

Sentia-me a desfalecer como um traidor reles que abandona o seu mestre no momento em que este mais dele necessita. Mas sei que não poderia mais ali ficar. Por muito que o negasse dentro do meu eu, um desejo de partida se fazia crescer como uma flor que brota na primavera em busca de um raio de sol para de novo aquecer a face da minha paz.

"Levo-te num abraço eterno que nós demos, numa praia onde me encontraste a brincar como uma criança, onde te sorri e adivinhei a tua chegada fazendo o tempo parar, desde a eternidade. Amanhã à mesma hora, não estarei aqui meu amor, estarei aí, contigo!"

(Continua…)

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